sexta-feira, 28 de setembro de 2012

- A Breve Longa História De Uma Atriz Pornô (parte I)


- Jasmine!
Já não me basta atuar como protagonista nessa porra e ainda tenho que ficar aqui até amanhecer?
Se é que filme pornô tem lá protagonista de moral ou história que se preze…
Além de ter que esperar um total babaca “entrar no clima” pra conseguir finalmente ter uma ereção; porque, francamente, a única atuação nesses curtas são uns gritinhos histéricos de puta mal comida. E olha que se não fosse por eles, ainda daria pra sentir algum tipo de prazer nessa profissão.
Profissão, Jasmine… Só se for pra servir de inspiração pr’algumas punhetas.
Mas que vida de merda, hein?!
- Jasmine!!
- Caralho, já vou indo!
E além de filho da puta, o que se chama por ‘diretor’ dessa budega ainda tinha que encarnar comigo.
- Que foi, Roberto? Que diabos tu queres comigo?
- Olha como fala comigo, loirinha. Vamos precisar gravar tua voz de novo.
- Que é? Mas isso precisa de dublagem, Roberto? Alguém por acaso liga pra roteiro de pornografia?!
- Se ligam ou não, eu não sei. Mas seus gritinhos melhoram o produto, e disso você sabe.
Não. Não sei mesmo. Depois de quatro anos como puta, a gente acaba esquecendo do que é realmente excitante e do que é puro enfeite pra orgasmo fingido.
Pelo pouco que lembro, a última vez que fiz algo que não fosse por dinheiro foi com aquele viado do Rogério. Eu, a idiota, sempre tive que cair na lábia de caras babacas. Esse, além de me trair com a vadia da Lúcia, ainda me obrigou a ser “compartilhada” com os amiguinhos dele.
Nojo.
Nojo deles. Nojo de mim.
Foi a primeira vez que perdi o que restava de minha moral; foi a primeira vez que me chamaram de puta. Com já não tinha mais nada, a única saída era fugir, foder com tudo e começar a cobrar por isso.
Literalmente.
- Então, - seu odor de whiskey e charuto velho me dava ânsia - é o seguinte: a gente contratou um novo editor e ele tá chegando aí. Será ele quem vai gravar tua voz de novo e colocar ela bonitinha no vídeo.
- Faça-me o favor, Roberto! Faz isso outro dia!
Já saía pisando firme quando ele me segurou pelos cabelos e sussurrou ao meu ouvido.
- Acho que a loirinha se esqueceu como é que eu gosto de tratar quem não faz as coisas como eu quero, não é? Se eu digo que a vamos gravar sua voz de novo, quer dizer que estou pouco me fodendo pro que você acha ou deixar de achar sobre isso. - Pigarreou e continuou, agora fazendo-me olhar em seus olhos. - Você é apenas mais uma das minhas putinhas, loirinha. E é bom que continue fazendo um bom serviço e da forma que eu mandar. Você sabe muito bem o que acontece quando alguém já não é mais… ‘útil’ aqui, certo?
Sim, eu sabia.
Filho da puta era elogio pr’aquele diretor. Roberto não só fazia o que bem entendia com “suas meninas”, como também fazia questão de expor aos quatro ventos o quão insignificante nós éramos. Tão insignificantes que nos encontrar em pedaços num latão de lixo não era algo tão fora de rotina.
Eu queria poder fugir dessa vida.
Nas noites de insônia, e não eram poucas, imaginava-me em algum outro lugar. Um lugar cheio de novas escolhas e novas oportunidades. Sem riscos, sem o esgoto que a prostituição me levara. Talvez eu continuasse com os estudos. Medicina, quem sabe? Lembro de adorar jalecos quando era menina…
Quem diria que o máximo que conseguiria seria uma fantasia de enfermeira ninfeta.
Suspirei, a única alternativa seria concordar com Roberto. Como sempre.
- Tudo bem, - disse me desvencilhando dele - gravo teus gritinhos de novo. Satisfeito?
- Completamente. - ele sorria de escárnio - E olha lá quem chega!
Avistei à porta um cara de óculos.
- Jasmine, esse é o Marcelo, - se referindo ao rapaz - nosso novo editor.
Observei o garoto da cabeça aos pés.
Ela me estendia a mão para cumprimentar com modos demasiadamente tímidos, parecia até que estava sendo acusado de algum crime.
Aparentava lá uns vinte anos e tinha cara de nerd estudante de engenharia genética; não só pelos óculos mas pela postura alinhada e o olhar educado. Que diabos ele fazia aqui?
- Bom, Marcelo, essa aqui é a Jasmine… - o cheiro de charuto já quase me fazia vomitar. Ou seria apenas o som da voz dele? - Ela é a protagonista do vídeo que você irá editar hoje. Aqui tem as fitas, mas o áudio saiu uma droga e eu quero que você grave as partes em que ela grita de novo. Conto com os gemidos dela porque, você sabe, nenhum pornô pode ficar sem gemido, né? - Claro, pornografia faz muita diferença na vida das pessoas… - Preciso ir e é bom que amanhã esteja tudo como eu pedi.
Roberto já alcançava a porta quando virou-se e me encarou como se fosse meu dono.
O que me revolta é que, de certa foma, era verdade.
Quis vomitar. De novo.
Ouvi a batida da porta da frente e o motor do Sedan se distanciando. O estúdio já estava vazio; estávamos completamente sozinhos.
Olhei novamente o garoto novo e percebi o olhar confuso e constrangido que ele me devolvia.
- Que diabos você faz aqui?
- Bom, - ele sorriu envergonhado - todo mundo precisa de dinheiro, certo?
Era verdade. Todos precisam de dinheiro. É ele quem reina nesse mundo podre.
E era por isso que estávamos naquele inferno.

-  Bruna Vieira, e a forma como o mundo é podre.
Nota: essa será uma série de contos dividida em algumas partes, ainda não sei quantas nem tenho ideia qual será o rumo que a história irá tomar. Irei descobrir da mesma forma que você, caro leitor.